Manifestado de diversas formas no organismo, o câncer é uma das doenças que mais assusta a população mundial. Segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), em 2012, houve um total de 8,2 milhões de mortes em todo o mundo. No Brasil, o número de doentes também cresce a cada ano. Em 2014, em dados do INCA – Instituto Nacional de Câncer, 576 mil novos casos são apontados no país. Por isso, a fosfoetanolamina surgiu como um esperança para aqueles que vivem com o câncer ou possuem algum conhecido com a enfermidade. Porém, a pílula azul e branca, distribuída pelo Instituto de Química da USP de São Carlos, não é considerada remédio e nunca foi testada em humanos. Entenda toda essa polêmica!
O QUE É A FOSFOETANOLAMINA?
A substância é produzida dentro do organismo, no fígado e nos músculos longos. Segundo pesquisas de Gilberto Chierice, professor aposentado da USP, ela é encontrada nas células cancerígenas e, por isso, poderia agir na defesa no organismo, atuando na cura da doença. Entretanto, Paulo Lotufo, diretor científico da Associação Paulista de Medicina, faz uma alerta: “nas células cancerígenas é encontrado de tudo, então, isso não significa nada. É uma ação totalmente irresponsável”, afirmou.
TESTES CLÍNICOS
Para ser considerado um medicamento, uma substância precisa passar por várias etapas criteriosas de teste. “É preciso fazer um teste pré-clínico, num laboratório regularizado, com animais. Se fosse aprovado em animais, aí teria a fase um, que verifica se não tem nenhum efeito tóxico. Depois, precisa comparar com o tratamento já conhecido. Então, imagine um tratamento para câncer de mama, você colocaria essa substância e daria o mesmo tratamento para dois grupos. Um desses, tomaria o placebo. Aí, seria possível ver o quanto iria melhorar o tratamento já existente”, explica Lotufo. As etapas são demoradas, pois para chegar ao mercado, após aplicar todos os testes, é preciso analisar os dados e ver qual é a melhor forma de oferecer o remédio à população. A fosfoetanolamina apresentou resultados positivos contra um tipo de câncer de pele, mas em camundongos, o que não foi suficiente para continuar a pesquisa na universidade.
ATENÇÃO
Como não existe estudo, não é possível nem prever a dose ideal para cada paciente. A Associação Paulista de Medicina enfatiza que o uso da substância pode interferir no tratamento vigente e trazer muito mais malefícios do que benefícios. “De mil moléculas testadas contra o câncer, 999 não dão certo. Os laboratórios testam isso o tempo inteiro. Falar que a fosfoetalamina cura é uma irresponsabilidade”, diz Lotufo.
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POR QUE A USP DISTRIBUI?
Ano passado, a USP proibiu a produção, alegando que não é fábrica de remédio. Alguns pacientes entraram com processo, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo deu razão à universidade. Mas, agora, a polêmica foi parar no Supremo Tribunal Federal e o ministro Edson Fachin derrubou a decisão, obrigando a USP a continuar com a produção e distribuição da substância. Em comunicado oficial, a universidade novamente enfatizou: “essa substância não é remédio. Ela foi estudada na USP como um produto químico e não existe demonstração cabal de que tenha ação efetiva contra a doença: a USP não desenvolveu estudos sobre a ação do produto nos seres vivos, muito menos estudos clínicos controlados em humanos. Não há registro e autorização de uso dessa substância pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e, portanto, ela não pode ser classificada como medicamento, tanto que não tem bula. Por liminares judiciais, a universidade foi obrigada a fornecer o produto para os que a solicitam”.
OPINIÃO DE ESPECIALISTAS
“Todos os remédios têm efeito colateral. Não é possível você garantir que uma droga é absolutamente segura, age contra a doença e não provoca nenhum mal ao organismo. Nunca existirá uma única droga capaz de tratar um único tipo de câncer, porque são mais de 100 doenças diferentes, cada uma delas dividida em vários subtipos. Então, toda vez que vocês ouvirem dizer que existe uma droga que vai curar todos os tipos de câncer, vocês precisam saber que não é verdade, que é um absurdo”, falou o médico Drauzio Varella ao Fantástico. “As pessoas falam que os laboratórios não têm interesse na cura do câncer. É mentira. Eles testam tudo o que puderem testar e, se for melhor para a sobrevida do câncer, será transformado em medicamento”, afirma. “Se você ou um parente seu está lutando contra o câncer, converse com seu médico e siga as orientações dele. Não caia em aventuras perigosas e, o mais importante, não interrompa o tratamento sem orientações médicas”, alertou Drauzio Varella.
LEI SANCIONADA
Uma lei sancionada por Dilma no dia 14 de abril, autoriza uso da substância. Segundo o documento publicado no Diário Oficial da União, o paciente diagnosticado com neoplasia maligna (câncer), poderá utilizar a fosfoetanolamina sintética em seu tratamento, mediante apresentação de laudo médico e termo de consentimento e responsabilidade. A autorização foi feita em caráter excepcional, já que os estudos clínicos feitos até agora não foram conclusivos e a ANVISA não ter registrado a substância. Através de nota, a agência afirma estar preocupada com a aprovação da lei, pois sem estudos clínicos necessários, não há como comprovar a segurança e a eficácia do medicamento.
PÍLULA INEFICAZ
Os primeiros testes com a substância já estão sendo feitos. As pesquisas, realizadas pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), atestaram que a fosfoetanolamina sintética foi ineficaz no tratamento de tumores em roedores.
Durante os experimentos um grupo de roedores recebeu a substância por 10 dias, já outro grupo, permaneceu sem tratamento. Ao final dos testes, os pesquisadores comprovaram que os roedores que receberam tratamento com fosfoetanolamina sintética não obtiveram melhora em comparação ao outro grupo.
TESTES EM HUMANOS
O ICESP – Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – divulgou que os testes em humanos com a substância fosfoetanolamina começam hoje (25).
Os testes serão realizados, inicialmente, em 10 pacientes. Após determinar a segurança da substância, a pesquisa poderá seguir com mais pacientes.
A próxima fase, que poderá contar com 210 pacientes, terá a duração média de 6 meses de testes.