Por mais que a Bíblia seja considerada um livro sagrado, fica a pergunta: seus dizeres devem ser interpretados ao pé da letra? A guerra entre as forças do bem contra o mal, narrada com dramaticidade digna de Hollywood no Livro do Apocalipse, é perfeita para ilustrar a polêmica. Afinal, o que realmente dizem as escrituras do Apocalipse? Existe algum grande segredo por trás de suas palavras?
A visão de Santo Agostinho
A discussão sobre o Apocalipse começa com Santo Agostinho (que viveu entre os anos 354 e 430), o primeiro grande pensador a afirmar que seus dizeres não deveriam ser interpretados ao pé-da-letra. Lembrou que muitas das passagens do livro não são claras e mesclam expressões literais com outras em sentido figurado, além de não apresentarem propriamente uma estrutura linear, com as mesmas coisas repetidas de forma diferente em outros pontos do texto.
Outros pensadores
O raciocínio de Santo Agostinho foi complementado por Ticônio, outro estudioso da época, que optou por não dar um tratamento histórico à mensagem, preferindo enxergá-la como símbolo dos conflitos morais dentro de cada pessoa e da igreja como um todo. Por sua vez, Joaquim de Fiore, já no século 12, propagou a visão fatalista. Alegou que, em uma manhã de Páscoa, uma revelação divina lhe deu o dom de compreender o verdadeiro significado dos textos de João de Patmos. Concordou com Santo Agostinho quanto a se descartar a contagem literal dos mil anos, no entanto, reforçou que o reino de Cristo na Terra ainda estava por vir. Seus seguidores, chamados de joaquinitas, chegaram a apontar o papado como representação do Anticristo, uma vez que este é descrito como um falso líder, dono de um número grande de admiradores. O estilo de vida franciscano, marcado pela renúncia a muitos dos confortos materiais e criticado por boa parte do Vaticano, seria a maneira mais digna de se manter fiel a Deus.
Martinho Lutero
Martinho Lutero (1483-1546), figura central da Reforma Protestante, responsável por uma profunda divisão dentro da Igreja Católica Romana, também via o papado como personificação do Anticristo – a perseguição sofrida pelos luteranos na ocasião somente reforçou o estigma. No entanto, diferentemente dos joaquinistas, Lutero pregava que os tais mil anos já haviam começado quando o Apocalipse foi escrito.
A aversão às autoridades eclesiásticas de Roma tronou-se grande principalmente na Inglaterra. Acontecimentos históricos posteriores como a Revolução Francesa e a ascensão de Napoleão alimentaram as especulações apocalípticas. A reação veio por parte dos jesuítas, que publicaram diversos, longos e eruditos tratados visando inocentar a cúpula católica de culpa e direcionando o cumprimento de qualquer profecia para um futuro além da compreensão humana.
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Texto: Marcelo Ricciardi / colaborador – Edição: Natália Negretti